Welket Bungué, actor e realizador

by Ana Carrilho (ana.carrilho@portugalfantastico.com) 

“Considero que já dei provas de poder interpretar personagens de dimensões distintas”

 

-Welket Bungué, natural da Guiné-Bissau é um talento jovem . Vieste para Portugal ha quanto tempo?

Eu e os meus pais imigrámos para Portugal no início dos anos 90. Passei a minha adolescência no Alentejo, e em 2007 regressei a Lisboa para continuar os estudos. Hoje sou formado e licenciado em Teatro e Performance, além de escrever Teatro e Cinema também dou pontualmente formação de Teatro, em 2014 espero lançar dois projectos um deles relacionado com mediação de profissionais das artes representativas e outro relacionado com a formação em acting dirigido para pessoas.

-A tua estreia como actor iniciou-se em que altura?

Desde 2005 que faço Teatro, inicialmente inscrevi-me num curso de formação teatral dirigido por David Silva. Tudo começou em Beja onde posteriormente fundámos um Companhia de Teatro, a Homlet que hoje se chama SEARA Companhia de Teatro de Beja. Regressei a Lisboa em 2007, por cá fui fazendo Teatro académico até ingressar na Escola Superior de Teatro e Cinema.

-Tiveste a oportunidade de estudar na Escola Superior de Teatro e Cinema, passado quanto tempo é que entraste no mercado?

Antes de ingressar na ESTC eu já havia feito peças como “Hamlet”, “Othello”, “A Gaivota” entre outros textos do W. Shakespeare, Tchékhov e Gil Vicente. Na verdade comecei a fazer cinema através das colaborações que fazia em Curtas Finais dos colegas da Universidade Lusófona, tudo isto aconteceu antes de ingressar para a ESTC assim como ter participado no elenco de “EQUADOR” ou no filme “KAMINEY” do realizador bollywoodesco Vishal Bahardwaj. Ir para a ESTC foi uma decisão importante, no fundo os meus mentores foram o meu amigo e encenador de formação David Silva e o meu amigo e agente Pedro Figueiredo da BOX. Ingressei na ESTC com o intuito de apurar o minha técnica de representação e sobretudo para me documentar artisticamente. Depois de entrar na ESTC tudo se encaminhou naturalmente para quele que erao meu objectivo desde sempre, o de ser actor de profissão sobre tudo vocacionado para o cinema. Assim, diria que estar no mercado é algo que aconteceu naturalmente mas não que tenha sido resultado do meu percurso na ESTC.

 

-Concordas que a carreira do actor não é linear, que existe uma minoria que entra no mercado, que é pequeno e altamente competitivo?

Pois claro, a carreira, na verdade a ideia de se querer ser ator é uma ideia dolorosa que exige muita coragem e dedicação. O mercado está voltado para uma mediatização do indiv- Últimamente temos te visto em participações em televisão e cinema. Tendo já feito também teatro, qual o peso de cada uma das vertentes para ti?

Acho que o Teatro sempre fez parte de mim, como referi acima foi através do Teatro que depois cheguei à televisão e ao cinema. Hoje estou mais ligado à Arte da Performance do que ao Teatro, mas continuo a frequentar as salas de espetáculo e a ler Teatro.

-Já ganhaste algum prémio com as tuas participações na 7º arte?

Já fui distinguido com o prémio de melhor ator pela minha actuação em “Mutter” e “A Dança de Sísifo” no Festival de Cinema Quinta Praia em 2012. Mas o melhor de tudo é saber que as equipas com quem trabalhei nas Curtas Metragens têm sido, em grande maioria, distinguidas em inúmeros festivais incluvise chegando a ganhar prémios de “Melhor Curta Metragem”, isso sim deixa-me bastante feliz.

-Recentemente tornaste-te realizador de um projecto que tem sido muito divulgado nas redes sociais, e optaste por um método de financiamento colectivo de modo a ser realizado em Janeiro. Como é que tem corrido até aqui?

Está a decorrer uma campanha de crowdfunding online para reunir fundos e garantir a produção da Curta BASTIEN. O site é www.massivemov.com/bastien, qualquer pessoa pode ajudar com uma quantia e no final receberá uma simbólica retribuição. A nossa Página de Facebook tem tido bastante visibilidade e os amigos e conhecidos estão a ajudar bastante partilhando todas as imagens e vídeos relacionados com a campanha de crowdfunding, e sobre tudo estando presente nos Eventos de Angariação de Fundos.

-Como realizador esta é a tua primeira experiência, porque decidiste apostar nesta experiência? Queres falar um pouco sobre este projecto e de onde surgiu a ideia?

BASTIEN é um argumento que estou a desenvolver desde 2011. É a primeira vez que irei realizar uma Curta, mas estou confiante de que será uma boa experiência. A ideia surgiu de ficcionar sobre um jovem com habilidades para a pintura e criação através de materiais plásticos, no entanto esse jovem vive com o irmão mais novo e a avó adoptiva no bairro de periferia. O jovem chama-se Bastien e tem problemas com rufias, neste drama de realidade social as coisas complicam-se porque há uma dívida que tem de ser paga e é Zezito que irá desencadear toda a actividade face a este problema. Achei que deveria ficcionar a partir de um tema e figura reais porque acho a ficção bem mais rica do que a realidade dos factos. Pensei em contar uma história de pessoas reais num lugar real, que as circuntâncias falassem por si mais do que propriamente as intenções das personagens. Vamos a ver o que sairá daqui.

-No elenco contas com a participação de uma actriz muito conhecida do público, Maria do Céu Guerra, como a trouxeste para o teu filme?

A Maria do Céu Guerra é uma atriz extraordinária, já a vi inúmeras vezes no Teatro. Qualquer amante das Artes Representativas ficaria encantado se a pudesse ter como atriz no seu elenco, nesse caso a personagem Dona Angustina foi concebida sem carne nem rosto mas assim que vi a Maria do Céu em cena no espetáculo “D. Maria a Louca” no Teatro A Barraca, percebi que deveria continuar a escrever tendo a imagem daquela personagem como referência. Convidei a Maria do Céu para fazer parte do filme e felizmente ao aceitar ainda me transmitiu mais obstinação para levar a cabo este projecto.

-Depois deste trabalho o que se segue, queres continuar a realizar?

É-me difícil falar sobre o amanhã se bem que o facto de existir a possibilidade de um dia vir a realizar deixa-me motivado para regressar aos estudos. Mas por outro lado, realizar é algo que tenho feito a vida toda, felizmente, no que toca aos meus objectivos pessoais e artísticos. Oxalá assim continue! Em Março devo regressar ao Rio de Janeiro para continuar a digressão do espetáculo “DONA MULATA E TRIUNFO”, uma encenação do Milguel Pinheiro da 10 PT – Criação Lusófona, entretanto já estreou no Festival de Cinema do Ceará a Curta “Tejo Mar”, de Bernard Lessa e ainda veremos em breve “Bicho”, de Miguel Munhá nos festivais de cinema nacionais. Posso também dizer que tenho mais quatro argumentos de Curta escritos, e assim que houver oportunidade penso criar outra parceria.

-Tens pessoas que admiras do teatro e da televisão e que possam ser influência nos teus trabalhos?

Eu sou sobre tudo influenciado por figuras do estrangeiro, mas aqui em Portugal há também artistas de respeito o que me leva a vê-los como referência. Alguns deles são o Daniel Martinho, o Filipe Duarte, o Ângelo Torres, a Rita Blanco, o Ivo Canelas, a Izilda Mussuela, a Ciomara Morais, o Fernando Pessoa, o Ruy de Carvalho... Bem, afinal ainda são alguns, bastantes. Ver os colegas a representar é sempre um experiência visual mas também de auto-crítica o que pode ser muito bom para quem procura melhorar as suas capacidades como ator e acima de tudo como pessoa.

-Tens tido papéis versáteis, entre personagens cómicas, trágicas ou papel de vilão? Qual foi até aqui o papel life changing?

Felizmente considero que já dei provas de poder interpretar personagens de dimensões distintas. Daqui para a frente penso que é uma questão d eprocurar o mercado mais adequado para mim, ou seja, um mercado onde possa trabalhar mais e melhor. Fiz trabalhos em que o processo criativo me marcou bastante, mas não houve ainda um papel que eu possa considerar que me deixou completamente irreconhecível ou que me tenha mudado no sentido da  personalidade. Mas, em 2009 interpretei Trigorin, um escritor e amante da natureza, é um tipo altamente instruído e educado, é ele o rival de Tréplev em “A Gaivota”.  Para esta personagem tive de trabalhar a postura, os modos a dicção e sobre tudo os trejeitos e confesso que depois dessa experiência acho que todo se reconhece influenciado pela personalidade daquele personagem!

-Quais sao os ingredientes fulcrais para existir um bom trabalho de equipa?

Um bom trabalho de equipa baseia-se essencialmente na frontalidade e no bom senso. As pessoas devem-se ouvir e ocupar-se com questões que garantem o avanço favorável daquilo que as uniu, independedentemente da natureza do projecto.

-Estamos a viver actualmente uma crise geral. Na tua opinião a cultura é das áreas mais prejudicadas?

Aqui está uma questão oportuna, a Cultura como instrumento de formação cívica deve prevalecer, e por isso há que investir nela sempre. O que a conjuntura nos mostra é pelo contrário, que a Cultura está na linha da frente daquilo que são departamentos onde se deva reduzir os investimentos já que ela mesma não é vista como uma fonte que gera lucros, quando na verdade é essencial para manter uma sociedade ativamente crítica e instruida, a Cultura é tão importante quanto a Educação ou o Desporto.

-Qual é a tua opinião sobre a iniciativa “Portugal Fantástico” ?

O projecto “Portugal Fantástico” faz jus ao nome e acrescento ainda que é mais uma vitória a favor do Cinema e dos artistas “amadores” que procuram independentemente das dificuldades, levar a cabo os projectos cinematográficos sem depender de subsídios ou estruturas de distribuição de filmes. As sessões de mostra e competição de filmes no “Portugal Fantástico” fazem sentido numa altura em que a Arte, e neste caso o vídeo surge cada vez mais como uma forma de veícular as experiências pessoais, de partilhar pontos de vista e valorizar o esforço de todo o amante que vê o cinema nacional a perder cada vez mais o apoio do estado, e que no fundo são estes que definirão o cinema nacional nesta década.