"O Nylon da Minha Aldeia" de Possidónio Cachapa (por: Ana Carrilho)

"O Nylon da Minha Aldeia"

Num cenário do nosso Alentejo nos anos 70, com a fotografia de Daniel Neves, cruzam-se dois personagens no enredo, Cristovão Campos como o Marcelo e Anabela Teixeira como a Lourdes. Marcelo é vitima de agressões e insultos pelos habitantes da aldeia, e também do seu pai.
É uma ameaça aos valores do machismo para aqueles habitantes e é considerado inferior ou aberração.
Nutre uma paixão por Sérgio, Tomás Alves, com quem vive uma relação sexual fortuita e silenciosa. Sérgio, ao contrário de Marcelo que se sente confortável com a sua preferência sexual, nega qualquer tipo de afecto e reprime-o. O contexto arcaico daquela aldeia invalida que Tomás afogue essa experiência sexual e mais tarde apareça ao lado de uma rapariga. Os homossexuais são “réus da morte” para os habitantes daquela aldeia.
Uma noite Marcelo convidado pelo silêncio, avista uma figura feminina á beira de um rio, a seduzir a lua com uma musicalidade e liberdade na voz. Enche-lhe o coração e sente-se mais autêntico. A figura feminina é Lurdes, o espelho de uma alma desapegada dos costumes daquela aldeia. Sem diálogos partilham sensações e criam laços de amizade, unem-se pela essência que ambos têm em comum. A fuga destes personagens na noite, evidencia a única altura que se sentem parte da aldeia.
Cristóvão Campos foi validado com o prémio de melhor actor nos Caminhos do Cinema Português em Coimbra.
Com a sua interpretação, na companhia da genuína Anabela Teixeira, e a estética da fotografia de Daniel Neves, que dá realismo, ambiente e sentimento a toda a história, só podiam oferecer-nos um resultado final muito positivo.
Sobressaio o momento do tema musical francês "Hello petite demoiselle", os rapazes inocentemente a desfrutarem das águas do rio, e com um sensível depuramento estético, somos soberbamente deliciados com a música e a imagem que vemos.
Possidónio Cachapa na verdade aborda um tema muito presente na sociedade. Não só presenciamos episódios de violência e descriminação nas aldeias mas também nas grandes cidades. Quando na verdade todos nós independentemente da nossa identidade sexual , e como cidadãos comuns, só queremos o bem estar dentro do nosso habitat.
Curioso também dizer que católicos, protestantes e outros conservam a negação contra a homossexualidade, mas esquecem dezenas de outras proibições decretadas…O que devia ser conservado é o coração puro, o respeito uns pelos outros e a solidariedade. E segundo o poeta Goethe “ a homossexualidade é tão antiga quanto a humanidade”.